Resenha: Years & Years – ‘Communion’
O trio britânico Years & Years viu o seu nome brilhar reluzente nos principais portais de música do mundo. Depois de encenar uma vibrante performance nos singles de estreia entre 2012 e 2013, eles foram surpreendidos após conquistarem o título de Sound of 2015 – um prestigiado prêmio concedido pela BBC aos novos artistas para ficarmos de olho. Nem mesmo o cancelamento do show agendado na edição deste ano no Meca Festival foi suficiente para apagar a chama que carregavam consigo.
Olly Alexander, Mikey Goldsworthy e Emre Turkmen dão voz e clima ao som do Years & Years, formado originalmente em meados de 2010 e que consistia em um grupo de cinco integrantes. Os percalços para manter uma banda independente em um cenário fadado às grandes produções eletrônicas fez com que se adaptassem ao estilo de mercado e, ainda sim, continuassem com a mesma essência do início. O resultado disso é o álbum ‘Communion’, que chegou às lojas no dia 10 de julho pela Polydor Records.
Flertando com diversos estilos da música eletrônica atual (como a nu-disco, deep-house e o eletropop), o trabalho apresenta um compilado de treze canções que, apesar da individualidade na promoção, trabalham sinergicamente como um todo. É como se cada canção revelasse um estado de espírito diferente.
Para começar, “Foundation” exala o tom mais sombrio e fúnebre de todo o registro. Composta de uma ligeira base eletrônica de fundo, Olly canta sobre um amor egoísta em que depositou todas as forças até não conseguir suportar mais. Talvez funcionasse melhor como última canção do disco, porém a ferocidade do vocalista em impor os próprios sentimentos deve realmente ser o início de um diálogo mais aberto.
Em seguida “Real”, uma das canções mais antigas do repertório do trio, quebra a melancolia da canção anterior para estender a deliciosa gama de sintetizadores robustos e bem colocados. A percussão tribal é um dos pontos fortes da produção. “Shine” é a canção mais premeditada do disco, tanto no quesito de produção como de divulgação. Em minha opinião, é aquela música que vai tocar insistentemente nas rádios e, cedo ou tarde, você não vai conseguir mais escutar.
A partir de “Take Shelter”, a banda começa a apresentar o motivo da sua existência. A música, que também é uma das antigas do repertório, não traz nenhuma novidade para o álbum, mas consegue salpicar o tempero mágico da música pop de hoje – Kiesza, Clean Bandit e Jess Glynne sabem bem como misturar esse tempero. Depois disso vem “Worship”, uma das produções mais legais do trio e que já demos o pitaco nesse post.
O ‘Communion’ nos reserva algumas surpresas e a versão de estúdio de “Eyes Shut” é uma delas. A faixa, que foi divulgada anteriormente em uma versão demo, revigorou a composição que muito se apoiou no ditado “o que os olhos não veem o coração não sente”. Composta de um piano melancólico e percussão vibrante, esse é um dos pontos altos do trabalho.
“Ties” introduz o momento mais dançante de todo o disco. É uma canção sobre encarar os medos em busca da sonhada conquista. Composta de um delicioso jogo de synths bem coordenados, a canção ganha nossos corações com o refrão grudento de diversos “ooohs”. A seguir, “King” e “Desire” se tornam os protagonistas de uma dançante celebração sobre seguir os próprios instintos.
A segunda surpresa está na décima canção chamada “Gold”, posto que antes suspeitávamos que seria de “Lion” (faixa vazada há poucos meses e que ficou de fora do disco). O Years & Years deixa de lado o clima alto astral para falar de como nos tornamos corruptos a fim de nos beneficiarmos de algo. Como se não bastasse a vibrante composição, a produção contempla influências da nu-disco e apresenta o refrão grandioso que tanto amamos. Já “Without” é a menos atraente de todo o registro, ainda acho que “Lion” poderia ter entrado no disco, talvez no lugar dessa aqui.
Desde que ouvi a música “Border” na versão ao vivo, sabia que se tratava de uma grande composição. No entanto, a produção cintilante adicionada ao resultado final é uma grande surpresa. A banda faz uma despedida ao passado e faz votos de uma vida repleta de novas conquistas a fim de encontrar a felicidade. “Estou indo para a fronteira, meu corpo ficará forte. Meu coração vai começar a brilhar e tudo vai ficar bem”, canta. Synths exuberantes se misturam às batidas veranescas para criar uma sonoridade praiana que combina exatamente com a proposta do disco.
O disco termina com uma das canções mais apaixonantes do Years & Years. “Memo”, conhecida previamente na versão acústica, ganha formas na versão de estúdio. Acompanhada de um piano melancólico, Olly entoa versos delicados de amor para um ex-namorado e suplica às memórias que o traga de volta para reviver tudo outra vez. Sem dúvida alguma, é uma das composições mais bonitas do disco.
A versão Deluxe do ‘Communion’ traz quatro faixas adicionais, sendo elas as inéditas “1977” e “I Want To Love” e as acústicas de “King” e “Ready For You”. A versão Super Deluxe ainda conta com as faixas “Breathe” e “Desire” ao vivo.
O saldo final é positivo. A sensação de ouvi-lo pela primeira vez é de que a banda “entregou o ouro” antes da data final, mas bastam algumas ouvidas a mais para ter a certeza de que cada música fornece uma energia diferente e, como eu disse, para cada estado de espírito. É certo de que as influências passeiam entre o eletropop, synthpop, nu-disco e deep-house – provavelmente a receita secreta de um disco consistente.
A verdadeira comunhão, pregada em letras neon na capa do álbum, não passa despercebido. Em quase todas as músicas, o trio insiste em usar temas como o amor e a cumplicidade para transformá-los em hits das pistas de dança. Quem nunca cantou alto e bom tom sobre os desejos de uma vida de paz que atire a primeira pedra.
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